Ensino remoto: inclusão ou exclusão?

Após o ensino remoto evasão no ensino superior aumentou 171%

Por: Carlos Vitor

https://pixabay.com/No ano de 2016, o Governo Federal aprovou o decreto da lei de inclusão (LDI 13.409/2016), onde garante o acesso das pessoas com deficiência (PCDs) no ensino regular e nas Universidades Públicas brasileiras para oferecer um ensino igualitário a todos. No entanto, episódios de capacitismo e exclusão são recorrentes no ambiente acadêmico. Com a pandemia novas tecnologias e metodologias emergem diariamente no espaço educacional, mas ainda sim, não são todos que conseguem seguir ou até mesmo concluir os estudos nesse novo contexto.

No ensino superior a política de cotas para os PCDs foi implantada somente no ano de 2018, fazendo com que muitos jovens buscassem uma vaga nas universidades pela ampla concorrência. Cleyfane Morais, estudante do curso de Administração na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), conta que optou por não revelar que era pessoa com deficiência de imediato. A jovem ingressou na Ufop em 2016, ano em que ainda não havia cotas para as pessoas com deficiência. Segundo ela, era difícil acompanhar as aulas, pois ninguém sabia que a graduanda é uma PCD, gerando um desgaste emocional e físico. “Cheguei a sair de uma aula chorando, pois o professor andava pela sala de aula, e sua voz era muito baixa, o que resultou na não compreensão do conteúdo”, lamenta.

Em 06 de Julho de 2015, entrou em vigor a Lei Nº 13.146, onde garantiu o direito à educação inclusiva a todos e também suporte técnico e educacional às famílias e alunos, no entanto, nem sempre esse direito é respeitado e os próprios estudantes precisam buscar alternativas para ter um aprendizado efetivo e completo, como conta Cleyfane : “Sempre sentei na primeira carteira e, o que eu não conseguia entender dentro de sala de aula, eu chegava em casa e tentava aprender procurando outros meios”. A jovem revela ainda que procurou seus professores e propôs um acordo, onde ficou estabelecido que uma semana antes, ela compareceria à sala dos professores para que juntos revisem o conteúdo.

Foto: Cíntia SoaresCristina Trindade, estudante de jornalismo.

(Foto: Cíntia Soares)

 

Cristina Trindade é graduanda do curso de Jornalismo e ao contrário de Cleyfane ela utilizou a política de cotas. A futura jornalista ressalta que os suportes e auxílios oferecidos pelo Núcleo de Educação Inclusiva (NEI) são bons e afirma ter um bom relacionamento com seus professores, mas ainda sim, a jovem ressalta que alguns aspectos devem ser revistos. “Eu acho que o atendimento do NEI é bom, mas no caso do campus em Mariana, a gente precisa de mais atenção, como por exemplo: colocando mais bolsistas do curso de Pedagogia no Núcleo e realizar uma reforma na sala”.

 

Sonho adiado

 

A pandemia colocou muitos jovens frente a frente com um dilema: tentar uma vaga na universidade ou levar comida para casa? Muitos optaram por adiar por mais um ano esse sonho. De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), em 2021 foram realizadas quatro milhões de inscrições no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), menor número desde 2007.

Vale ressaltar que, dentre os inúmeros motivos que o ocasionaram essa redução no número de candidatos, estão a perda de vínculo com os estudos, após problemas no ensino remoto, a impossibilidade de fazer faculdade em outro estado, por causa da crise financeira e o ingresso precoce no mercado de trabalho, além do aumento de casos de depressão e ansiedade.

Adriene Santanna é pedagoga do Núcleo de Educação Inclusiva da Universidade Federal de Ouro Preto, ela explica que durante o ensino remoto houve somente uma intervenção do Governo Federal com objetivo de evitar a defasagem no ensino, onde foram disponibilizados gratuitamente chips para os estudantes, entretanto, não foi suficiente e a instituição realizou outras ações independentes, que atenderam a toda comunidade acadêmica. “As ações implantadas pela Ufop foram mais globais, como o auxílio digital, mas o governo também ofereceu chips gratuitos para os estudantes, contudo, muitos reclamam que não conseguem acessar os conteúdos e aulas com internet móvel”, relata.

 

Foto: arquivo pessoal

Adriene Santanna, pedagoga do NEI.

(Foto: arquivo pessoal)

 

A profissional ressaltou ainda, que durante o Período Letivo Emergencial (PLE) os graduandos que estivessem nas cidades de Ouro Preto, Mariana e João Monlevade puderam solicitar o empréstimo de tecnologias assistiva e utilizar durante o período, porém o número de aparelhos disponíveis e a falta de manutenção foram empecilhos e contribuíram para que os alunos optassem por aguardar o retorno presencial para concluírem determinadas disciplinas.

 

Novas formas de ensinar e aprender

 

Os professores, assim como nós, estudantes precisaram aprender a como ensinar no “novo normal”. Muitos nunca haviam utilizado plataformas digitais ou elaborado slides. Adriene explicou que a equipe do NEI propôs à Pró Reitoria de Graduação da Ufop (PROGRAD) um curso de capacitação para os docentes aprenderem como utilizar tecnologias que auxiliam na inclusão dos estudantes PCDs, mas não foi possível. “Nós tentamos realizar um curso para ensinar como funciona os recursos de acessibilidade aos professores, mas a instituição achou que iria ser complicado, pois os docentes já estavam lidando com muitos recursos tecnológicos”, afirma.

A mestre em Educação Ana Carolina Alves, aponta que podemos elencar vários fatores que limitam ou impedem a real participação dos sujeitos, limitando a acessibilidade. “Podemos observar diversas dificuldades na recepção de pessoas com deficiência, por parte das instituições de ensino, de efetivar uma inclusão de qualidade, tendo em vista que ainda não conseguiram romper com as barreiras ainda presentes na educação”, destaca. Ana relembrou também, que o trabalho realizado pelo Núcleo de Educação Inclusiva é fundamental, pois oferece um apoio a todos, efetuando a adaptação de materiais e de recursos, que é dado pelos docentes aos alunos, além de facilitar a inserção do jovem na sociedade e promover a conscientização dos servidores da universidade.

 

Retorno presencial

 

Após muitas discussões, dúvidas e estudos a Ufop anunciou no fim do mês de novembro que iria retomar as atividades presenciais. Na reunião realizada com o Conselho Universitário, Centros Acadêmicos e outros departamentos foi apresentado um Plano de Contingência, definindo o retorno para o dia 15 de março de 2022. Apesar da decisão já ter sido tomada,há questionamentos que ainda não foram respondidos, como a possibilidade da continuação do trabalho e ou ensino remoto para técnicos e graduandos que tenham alguma comorbidade.

Devido a necessidade dos alunos se alimentarem nos Restaurantes Universitários (RUs) e dificuldades para encontrar uma moradia, uma parcela dos estudantes são contra o retorno no momento e iniciaram uma campanha na internet. Com tudo, a instituição afirma que está atenta às necessidades de todos e que disponibilizou um formulário para ouvir os universitários. Ana Carolina e Adriene garantem que é necessário o envolvimento de todo o sistema educacional durante o processo de inclusão, visando a promoção de acessibilidade a todos os discentes, juntamente com a eliminação de todas as barreiras (atitudinais, físicas, comunicacionais e metodológicas) desde o processo de matrícula do estudante até a conclusão do curso.

Portanto, as perguntas que ficam é: seria o melhor momento de retornarmos? Como será realizado este movimento? Todos os alunos e suas necessidades serão atendidas? Infelizmente, ainda não temos as respostas, mas esperamos que haja uma volta segura e inclusiva para todos, pois como observamos o modelo de Ensino a Distância possibilitou algumas comodidades, porém evidenciou a exclusão digital do nosso País.