Viçosa sofre impactos com o retorno presencial da UFV

Após quase dois anos de pandemia civis, estudantes, professores e comerciantes se preparam para a volta às aulas

Por: Beatriz Tinôco

Zona da Mata Mineira, Viçosa possui cerca de 79 mil habitantes - Prefeitura de Viçosa. Zona da Mata Mineira, Viçosa possui cerca de 79 mil habitantes - Prefeitura de Viçosa. 

 

Universidade Federal de Viçosa se prepara para receber cerca de 17 mil estudantes. - Foto: GoogleUniversidade Federal de Viçosa se prepara para receber cerca de 17 mil estudantes - Foto: Google. 

 

 

À medida que a vacinação contra o vírus da Covid-19 obtém avançados níveis no Brasil, com a dose de reforço nos idosos, aplicação em adolescentes e aprovação para crianças, o cotidiano dos brasileiros se adequa a um novo normal. Nesse cenário, as atividades comunitárias, em meio a restrições sanitárias, começam a retornar. Um exemplo, é a Universidade Federal de Viçosa (UFV), que se prepara para receber cerca de 17 mil estudantes em janeiro de 2022. No entanto, o planejamento estudantil se ramifica com o social, uma vez que a cidade também está passando por mudanças para essa retomada.

 

Comércios lojistas e imobiliários, bares e restaurantes da comunidade viçosense estão voltando com capacidade reduzida, mas possuem esperanças e receios quanto ao retorno, de cerca de 17% da população flutuante que circulava antes da pandemia, conforme informado pelo vereador do PCdoB, Daniel Cabral, 24 anos. Há cidadãos que temem esse regresso por não verem uma estrutura eficaz para a recepção, já outros acreditam que esteja na hora. Para entender esse contexto, é preciso saber as mudanças que a cidade passará para receber novamente, após quase dois anos de quarentena, trabalhadores e estudantes.

 

A CIDADE

 

Em 1922 com a criação da universidade por Arthur Bernardes, a cidade de Viçosa foi estruturada a partir da instituição, não tendo, assim, uma infraestrutura própria, como outras cidades universitárias. O panorama viçosense para as aulas presenciais, é peculiar, já que a comunidade foi construída a partir das condições da UFV. Pensar em como a localidade é dependente e dirigida para o campus impacta diretamente a vida urbana.

Os Poderes Executivo e Legislativo da cidade planejam a tão esperada recepção. O vereador Daniel Cabral, criou com todas as secretarias do município e a UFV um Comitê de Infraestrutura, visando estabelecer um plano para o retorno. A preparação para a volta universitária foi marcada por diversas tentativas, como a pensada para a metade de 2021, mas o agravamento da terceira onda de contaminação impediu.

“A UFV produz ciência de qualidade, contribuindo nas pesquisas, como da vacina, auxiliou a cidade, ofereceu sua estrutura para testagens e vacinação, acredito que seja o momento ideal, mas pode sofrer alterações”, pontua Cabral. Posto isso, a correlação entre campus e município nunca foi tão necessária, pois implica o uso dos recursos públicos.

Como exemplo, uma crise hídrica, aumento de lixo, aumento dos pedidos nos hospitais e clínicas. “Os estudantes usufruem da estrutura da cidade, precisamos pensar na maior demanda que Viçosa terá e como faremos essa assistência. O Comitê trata quais as melhorias precisamos sanar, como o aumento de festas universitárias, a criação de um cadastramento e a saúde primária que fornecerá o auxílio necessário aos estudantes”, expressa Cabral.

A Prefeitura discute sobre a dose de reforço da vacina, onde e como será ministrada. Ou seja, o esquema vacinal da cidade terá um aumento significativo com os novos habitantes, e isso terá de ser planejado junto ao Governo de Minas para que a cidade receba mais vacinas.

O vereador Daniel Cabral também diz que a cidade tem um potencial para eventos muito grande, demandando um olhar coletivo, e acredita que um incentivo nesse setor ajudará a fomentar a economia no pós-pandemia. Isso porque os estudantes são os maiores consumidores de festas, e contribuem, assim, para as vendas nos comércios e eventos.

Mas esse retorno festivo terá um cadastramento nas festas para acompanhar pessoas presentes, o que ajudará em um controle de uma possível onda de contaminação. Além disso, segundo o projeto de lei, Passaporte da Vacina, será exigido na porta dos eventos.

Com essa postura, a fiscalização para as regulamentações que a Prefeitura espera vai além da conscientização da população e dos estudantes, mas também de um acompanhamento dentro e fora do campus. “Precisamos de boas lideranças e de pessoas competentes nos representando em cargos importantes, de uma estrutura estatal muito forte, coisa que falhou no país”, explicita Daniel Cabral.

 

COMERCIANTES

 

Não se pode negar a ligação entre a Universidade e a cidade, principalmente, quando olhamos para a questão comercial que abrange o seu cotidiano. “Percebemos uma alta na procura, cidade mais movimentada, e sentimos o fluxo de gente entrando e saindo na imobiliária”, conta o corretor Lucas Machado, 36.

O mercado imobiliário de Viçosa está diretamente ligado à UFV, uma vez que ela traz os estudantes para o município. Os preços dos aluguéis e a alta procura de apartamentos, por um lado levam a um alto reajuste pelos locatários, devido ao tempo sem contratos, e por outro diminuem as opções para os cidadãos de Viçosa. “Com duas semanas, o mercado aqueceu e encareceu, fizemos uma mediação entre os dois extremos, mas há alguns que estão irredutíveis”, relata Machado.

Notam-se problemas na volta dos estudantes. As dificuldades como a falta de apartamentos e os altos preços preocupam aqueles que estão vindo para a cidade. Além disso, Machado cita que há uma falta de infraestrutura para receber novamente os alunos, isto porque dentro do campus há uma disciplina, mas no centro urbano há um relaxamento das medidas que controlem a população.

“Há bem pouco tempo, passamos por dificuldades na cidade com o Covid-19, e não há como controlar, é bem complicado”, Machado relata preocupação com a volta das festas e dos alunos. Ele ressalta, que, como não há recursos, o receio era que não houvesse atendimento, e teme isso agora.

A lojista Júnia Paes, 34, também sente esse medo: “No início ficamos com um pouco de medo, mas é uma mistura de sentimentos, ainda mais pelo tamanho da recepção”. Com isso, apesar de desejar uma volta efetiva, já que os estudantes também movimentam o mercado interno, o cuidado e atenção para a volta serão maiores, pontua Paes.

A volta das festas, mercados, aluguéis, vendas de roupas e produtos cresceu. “Agora vemos um retorno das vendas no presencial, antes era mais pelo online, melhorou muito e voltou cerca de 60% nas vendas, mas chegará até o final somente quando os estudantes voltarem”, conta Paes. Devido à cadeia produtiva, os preços se expandiram em todos os setores, como na mão de obra, matéria prima, fabricação e consumo.

 

ESTUDANTES

 

A volta das aulas presenciais é desejada pelos muitos setores da sociedade, mas a maior ansiedade e expectativa está concentrada nos estudantes. Tanto aqueles que deixaram a cidade e retornaram para suas cidades em 2020, quanto os que ainda não viveram no campus, mas aguardam a volta para se instalarem pela primeira vez.

Portanto, alguns ânimos e inquietações angustiam os antigos e novos alunos, seja para estarem novamente no meio acadêmico seja para iniciar essa vida. “Senti um alívio quando soube do retorno, estou ansioso por esse momento, creio que esse retorno está ajustado ao novo normal que a cidade está vivendo, o que falta são as aulas, temos que nos adequar”, relata Marcos Dornelas, 21, estudante de Zootecnia na UFV.

Nesse ínterim, vale salientar que por mais vontade que haja para as aulas presenciais, o campus tem a responsabilidade por zelar pelo bem-estar dos alunos e muitos esperam que ela adote certas medidas para isso. Alguns alunos sentem que falta, por exemplo, uma posição mais assertiva do corpo acadêmico, especialmente por Viçosa não ter uma estrutura que consiga receber e assistir os estudantes.

"Perguntei a alguns professores sobre testes gratuitos dentro do campus e eles me disseram que não, vamos contar apenas com distanciamento e álcool em gel”, narra Thayana Soares, 22, estudante de Educação Física. Nesse contexto, a assistência aos alunos, prevenção de contaminação e controle do vírus pode acarretar um congestionamento dos atendimentos em hospitais. Soares acredita que o centro acadêmico tem a capacidade de fazer um planejamento, junto à Prefeitura, que se responsabilize pelos estudantes e cidadãos, mas requer uma iniciativa.

Contudo, além da insegurança, a questão econômica traz outro problema para os estudantes, uma vez que alguns foram afetados com a pandemia, devido à perda de apoio da UFV, como bolsas e auxílios. Sendo assim, o corte de bolsas, a não criação de novas ofertas para os alunos, aumento de imóveis e do restaurante universitário, marcam uma inviabilidade do acesso a uma universidade federal, gerando uma evasão acadêmica.

“Acredito que a UFV e a cidade estão se programando para a volta, mas só vamos saber na prática, quando todos estiverem na cidade, uma vez que tudo é muito imprevisível, só depende de um bom planejamento”, narra Letícia Guimarães, 21, estudante de Jornalismo na UFV.

 

O CAMPUS

 

De acordo com o portal de notícias do site da Universidade Federal de Viçosa, em 22/11/21, a instituição começou um Período Híbrido de Transição (PHT), nos três campi da UFV – Viçosa, Florestal e Rio Paranaíba. Como previsto no calendário unificado, aprovado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe), esse retorno está marcado para o dia 24 de janeiro de 2022. Podendo também, serem feitas em meio semipresencial ou remoto, conforme os colegiados e departamentos decidiram.

Cristiane Baquim, assessora especial da Pró-Reitoria de Ensino (PRE), explicou que a Universidade se preparou da melhor forma possível para o retorno das aulas presenciais. E, segundo a Resolução 17/2021 (https://www2.dti.ufv.br/noticias/files/anexos/1634730760.pdf) do Cepe, segue as instruções para guia. A título de exemplo, a norma regula a autorização da oferta de disciplinas em modo híbrido, as datas para o início e fim do período remoto (22 de novembro de       2021 a 22 de dezembro de 2021) e o início do novo em formato presencial (24 de janeiro        de 2022 a 2 de abril de 2022).

O novo modelo contará com a disponibilidade da oferta das disciplinas em três tipos, o primeiro, integralmente presencial, em caráter prioritário, o segundo em      casos justificados, semipresencial, ou em terceiro caso, formato remoto.

Ainda assim, o medo de grande parte da população viçosense e dos estudantes, da contaminação e falta de preparo da Universidade, pode ser resolvido com o artigo 2º, inciso XI. “Para acesso às disciplinas presenciais ou semipresenciais, será obrigatória a apresentação de documento constando o esquema vacinal completo contra a Covid-19”.